O quarto de Clara estava
tão bagunçado quanto ela se sentia por dentro. Pilhas de roupas jogadas na
cadeira, um livro aberto no chão, e a cama mal arrumada. Ela estava sentada no
meio daquele caos, abraçando um travesseiro como se fosse a única coisa que a
sustentava. Ana, sentada no tapete encostada na cama, segurava uma caneca de
chá que já tinha esfriado.
—
Ele te bloqueou mesmo? — Ana perguntou, quebrando o silêncio que já
durava alguns minutos.
Clara
olhou para o chão, evitando o olhar da amiga.
— Bloqueou. Primeiro no WhatsApp, depois nas outras redes sociais... É como se ele quisesse me apagar da vida dele de uma vez.
Ana
franziu a testa, mexendo na borda da caneca.
— Isso é duro, amiga. Mas o que você sente agora? Raiva?
Tristeza?
Clara
soltou um riso amargo.
— Tudo junto. Às vezes, fico com raiva dele por ser tão
covarde. Em outros momentos, acho que é culpa minha, que eu deveria ter feito
algo diferente. E, no fim, só sobra essa tristeza que parece que vai me
engolir.
Ana
suspirou e colocou a caneca no chão.
— Ok, mas vamos lá... você acha que ele realmente merece
essa energia toda que você tá gastando?
Clara
levantou o olhar, mostrando um pouco de irritação.
—
Não é questão de merecer, Ana! Não dá pra desligar o que eu sinto como se
fosse um botão. Ele era importante pra mim, e agora eu nem sei o que fazer com
tudo isso aqui dentro. — Ela apontou para o peito.
Ana
ficou em silêncio por um momento, escolhendo bem as palavras.
— Tá, eu entendo. Não é fácil. Mas ficar nessa dúvida,
esperando que algo mude, não tá te fazendo bem.
—
E o que você quer que eu faça? — Clara rebateu, com a voz embargada. — Esqueça?
Finja que nunca aconteceu?
—
Não, não é isso... — Ana respondeu, tentando manter a calma. — Esquecer
não é fingir que nada existiu. É aceitar que acabou e dar um espaço pra você
mesma se curar.
Clara
deixou o travesseiro de lado e cruzou os braços.
— Fácil falar, né? Você não tá sentindo o que eu sinto.
Você já teve alguém que parecia ser tudo e, de repente, te jogou fora como se
fosse nada?
Ana
engoliu seco, lembrando de seus próprios traumas.
— Já. E foi horrível. Passei meses chorando, me culpando,
revivendo cada detalhe. Mas sabe o que eu aprendi? Ficar presa nessa espera só
me machucava mais. Era como se eu tivesse me acorrentado a algo que nem existia
mais.
Clara
olhou para ela com os olhos cheios de lágrimas.
— Então, o que você fez?
Ana
se mexeu no tapete, aproximando-se da cama.
— Eu comecei devagar. Primeiro, parei de checar as redes
sociais dele. Depois, tirei as fotos do meu celular, mas guardei num lugar onde
eu não visse todo dia. Não foi de uma vez. Esquecer é um processo, não uma
decisão de um segundo.
—
Mas e se eu esperar? Se der mais um tempo? Talvez ele volte... — Clara
sussurrou, como se nem ela acreditasse no que dizia.
Ana
balançou a cabeça.
— Pode ser que volte. Ou pode ser que não. Mas, enquanto
você espera, a sua vida tá parada. Ele tá seguindo em frente, e você? Tá aqui,
sofrendo por alguém que nem sequer se importa o suficiente pra te dar uma
explicação.
Clara
abaixou a cabeça, sentindo o peso das palavras da amiga.
— Então, eu só devo desistir?
Ana
segurou a mão de Clara com firmeza.
— Não é sobre desistir. É sobre se escolher. Sobre entender
que você merece mais do que alguém que te trata assim. Não tô dizendo que vai
ser fácil, mas você precisa começar a pensar no que te faz bem, não no que ele
vai ou não fazer.
O
quarto ficou em silêncio, exceto pelo barulho leve da chuva começando lá fora.
Clara passou as mãos pelo rosto, respirando fundo.
— Eu não sei se consigo...
—
Você consegue — Ana respondeu, firme. — E eu tô aqui pra te ajudar.
Mas, por favor, não se abandone por causa de quem já decidiu te abandonar.
Clara
deixou escapar um pequeno sorriso entre as lágrimas.
— Obrigada, Ana.
—
Pra isso que servem as amigas. — Ana respondeu, puxando Clara para um
abraço apertado.
Naquele
quarto bagunçado, no meio de tanto caos, Clara sentiu que talvez pudesse
começar a organizar a própria vida — um passo de cada vez.
Esperar
é acreditar que algo ainda pode acontecer, é dar espaço para a possibilidade,
mesmo que ela pareça distante. É como manter uma vela acesa em um quarto
escuro, esperando que a luz ilumine tudo novamente. Porém, esperar exige
paciência e, muitas vezes, pode nos manter presos em um lugar que já não nos
pertence.
Esquecer,
por outro lado, não é apagar o passado, mas aceitar que ele não pode ser
mudado. É liberar espaço para novas experiências, deixar que as feridas
cicatrizem e entender que o tempo não volta. Esquecer não é sinal de fraqueza;
é um ato de coragem, de desapegar do que nos machuca para seguir em
frente.
A
moral do diálogo entre Clara e Ana é clara: não se trata apenas de esperar ou
esquecer, mas de se escolher. Às vezes, o mais importante não é decidir rápido,
mas respeitar o próprio tempo, cuidar de si e lembrar que o amor-próprio sempre
deve ser maior que qualquer dúvida ou dor.
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