Era
início da tarde quando Henrique, dono de uma pequena loja de materiais de
construção, chamou Gustavo, um de seus funcionários, para conversar no pequeno
escritório. O clima estava tranquilo, mas Henrique sabia que precisava abordar
o assunto com cuidado. Gustavo, de 20 anos, era esforçado, filho de uma antiga
funcionária da empresa, que se aposentou, mas ultimamente parecia
desmotivado, trabalhando no automático.
Henrique
acreditava no potencial de Gustavo, mas há dias que vinha observando o seu
funcionário no trabalho e percebeu que ele parecia aéreo, desmotivado e temia
que esse comportamento poderia até mesmo causar um acidente, devido a falta de
atenção. Diante disso e em consideração à Vera, mãe de Gustavo, resolveu chamar
o rapaz para uma conversa e entender o que estava acontecendo.
—
Gustavo, tudo bem? — começou Henrique, gesticulando para ele se sentar
na cadeira em frente à sua mesa.
— Tudo, sim, chefe. Aconteceu alguma coisa? — respondeu Gustavo, desconfiado.
Henrique
apoiou os braços na mesa e olhou diretamente para ele.
— Cara, vou ser direto. Notei que você anda meio pra baixo
no trabalho. Sabe, essa sua falta de atenção, além de não estar rendendo no
serviço, pode causar um acidente com você ou com um dos seus colegas. Tá tudo
certo com você?
Gustavo
hesitou. Olhou para o chão e depois de alguns segundos, respondeu:
— Ah, eu tô bem, só... não sei. Parece que nada faz sentido
ultimamente.
—
Como assim? — Henrique arqueou a sobrancelha, intrigado.
— Sei lá, Sr. Henrique. Eu venho aqui, faço o que tem que
fazer, vou pra casa... e no dia seguinte é tudo igual. Sinto que não tô indo a
lugar nenhum, sabe? Eu queria mais pra
mim.
Henrique
respirou fundo. Era exatamente o que ele suspeitava. A ansiedade que quase todo jovem tem por querer que seus sonhos se realizem do dia para a noite.
— Entendo. Mas já pensou que talvez o problema não seja o trabalho, mas como você está se cobrando por não estar conseguindo ver o seu futuro? Está tão preocupado em cumprir tua rotina diária, o que não deixa de ser indicação de responsabilidade e dedicação, mas não percebe oportunidades que estão à tua volta.
Gustavo
franziu a testa, confuso.
— Como assim?
—
Olha, vou te contar uma história — Henrique apoiou-se na mesa. — Imagine
um navio ancorado no porto. Está seguro lá, não é mesmo? Não corre o risco de enfrentar
uma tempestade ou se perder no mar. Mas... foi para isso que ele foi feito?
Gustavo
balançou a cabeça, lentamente.
— Acho que não. Acredito que o navio foi feito pra
navegar.
Henrique
sorriu.
— Exato. Só que, pra isso, ele precisa enfrentar o mar. Às
vezes, vai ser tranquilo, outras vezes vai ter onda alta, vento forte, mas é
nesse vai e vem que ele cumpre o propósito dele.
Gustavo
ficou em silêncio por alguns segundos, absorvendo aquilo.
— Você tá dizendo que eu tô parado no porto, igual um
navio?
— Talvez, Gustavo. Às vezes a gente fica parado demais, com
medo de arriscar. Só que isso também desgasta a gente, sabe? Igual ao navio que,
parado, sem sair do lugar, enferruja.
—
Faz sentido... — Gustavo admitiu, com um leve sorriso. — Mas como eu
faço pra sair desse porto?
Henrique
inclinou-se para frente.
— Primeiro, você tem que descobrir qual é a sua rota, por
qual mar você vai ter que navegar. Descobrir o que você realmente quer fazer? O
que te empolga?
—
Eu gosto de aprender coisas novas — Gustavo respondeu, com um brilho
tímido nos olhos. — Mas aqui eu sinto que tô sempre fazendo a mesma
coisa. Todos os dias.
— Já pensou em sugerir mudanças? Apresentar novas ideias?
Talvez até aprender algo que ajude a loja e, principalmente, também te
desafie.
—
Tipo o quê? — perguntou Gustavo, curioso.
— Sei lá, pode ser aprender sobre outros métodos de venda, online, por exemplo. A loja precisa atrair novos clientes. Você pode aprender a usar as redes sociais pra aumentar as vendas. Retome os estudos, faça cursos. Solte as amarras. Saia do porto, navegue por novos mares. Não espere que outros navios façam a sua viagem. Se você quiser, posso te ajudar com isso, te indicando alguns cursos. Tu sabe que sempre tratei meus funcionários como amigos e essa porta está sempre aberta pra vocês, para resolver qualquer dúvida. O rendimento de vocês reflete diretamente no rendimento da empresa, portanto devemos sempre estar sintonizados.
Gustavo
pareceu animado pela primeira vez em semanas.
— Sério? Acho que seria legal!
— Então, bora navegar, Gustavo. Ninguém espera que você
saiba tudo no começo. Mas o importante é dar o primeiro passo. Ajustar as
velas. Aproveitar o vento.
Gustavo
deu um sorriso mais confiante.
— Acho que o senhor tem razão.
Henrique
estendeu a mão para ele.
— Eu sei que tenho. Só não deixa o medo te segurar, cara. O
mar é grande, mas você é mais forte do que as ondas. A loja precisa de navios
que suportem a carga e que saibam escolher novas rotas.
Aquele
diálogo mudou algo em Gustavo. Ele saiu do escritório com uma nova energia,
disposto a fazer mais e ser mais. Porque, no fundo, ele sabia que tinha passado
muito tempo ancorado no mesmo lugar — e era hora de zarpar.
A
história de Henrique e Gustavo traz uma lição poderosa sobre a importância de
sair da zona de conforto e abraçar desafios como parte do crescimento pessoal e
profissional. Gustavo, apesar de esforçado, se via preso em uma rotina
monótona, incapaz de enxergar propósito ou evolução. Henrique, com
sensibilidade e sabedoria, usou a metáfora do navio para ilustrar que o
verdadeiro potencial só é alcançado quando enfrentamos os "mares" da
vida, com suas calmarias e tempestades.
A
moral da história é clara: permanecer em segurança, evitando riscos, pode
parecer confortável, mas também pode levar à estagnação. Assim como o navio não
foi feito para ficar no porto, as pessoas precisam explorar, aprender e se
desafiar. Para quem lê, a mensagem é um convite: identifique seu "porto
seguro" e pergunte-se se não é hora de navegar em direção a algo maior.
Afinal, o crescimento exige coragem para ajustar as velas e confiança para
enfrentar as ondas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário