Isabela
estava fazendo as unhas na sala de casa, quando seu irmão, Fábio, chegou do
trabalho.
—
Cara, tô me sentindo meio estranho esses dias. — disse Fábio, jogando a mochila
no chão da sala, com um suspiro pesado. O tipo de suspiro que carrega cansaço e
algo que não se explica fácil.
—
Estranho como? — perguntou Isabela, largando o esmalte sobre a mesa e cruzando
as pernas. O olhar curioso denunciava que ela queria entender mais.
—
Sei lá... parece que tô sozinho no mundo, sabe? Não importa onde eu esteja, eu
sinto que ninguém me entende de verdade. É como se eu tivesse desconectado de
tudo.
—
Hum, entendi. Você tá falando de solidão? É aquela sensação esquisita de vazio,
tipo estar no meio de uma multidão e, ainda assim, se sentir sozinho?
— É isso! Bem desse jeito. E é ruim, sabe? Pesa. Às vezes, até gosto de ficar sozinho, no meu canto, mas tem horas que eu até queria conversar, fazer parte de algo, e parece que estou invisível para o resto do mundo, como aconteceu agora na faculdade, por exemplo.
— Olha, solidão é bem isso mesmo: se sentir isolado, desconectado, como se você não pertencesse àquele lugar em que se encontra. Mas sabia que muita gente confunde solidão com solitude?
—
Solitude? Nunca ouvi falar dessa palavra.
—
Pois é, é uma palavra meio esquecida, mas importante. Solitude é quando você
está sozinho por escolha, e gosta disso. É aquele momento em que você curte
estar só, sem precisar de companhia pra se sentir completo. É como se fosse um
abraço em si mesmo.
—
Tipo quando eu escuto música sozinho no quarto pra pensar melhor? Ou quando dou
um rolê de bike sem falar com ninguém?
—
Exatamente! Isso é solitude. A diferença é que na solidão você sente falta de
algo, como se algo estivesse errado. Na solitude, você se sente em paz,
conectado consigo mesmo.
—
Nunca pensei nisso desse jeito... Mas então, como eu saio dessa sensação ruim
de solidão? Porque, sinceramente, tá um saco.
—
Primeiro, aceita que tá tudo bem não estar rodeado de gente o tempo todo. Tem
muita gente que se obriga a ir pra festas ou lugares cheios só pra não encarar
a própria companhia. E isso é bem comum.
—
Já fiz isso várias vezes... E sabe o que é pior? Fico mais vazio ainda.
—
Porque a solução não é quantidade de gente ao seu redor, mas qualidade — tanto
das suas relações quanto do tempo que você passa consigo mesmo.
—
Faz sentido. Mas transformar essa sensação de solidão em solitude parece meio
abstrato, não?
—
Nem tanto. Em vez de pensar "ninguém quer estar ou falar comigo", tenta pensar
"vou aproveitar esse tempo pra cuidar de mim, descobrir coisas
novas". É uma mudança de perspectiva.
—
Parece mais fácil falar do que fazer.
—
É verdade, no começo é estranho mesmo. Mas funciona. Quando você começa a
gostar da sua própria companhia, tudo muda. Sério.
—
Mas isso não é meio egoísta? Sei lá, gostar de estar sozinho parece que você
não liga pros outros.
—
De jeito nenhum! Egoísmo é ignorar os outros por conveniência. Solitude é
autocuidado, é se dar tempo pra respirar, se entender. Quando você aprende a
fazer isso, suas relações com os outros até melhoram.
—
Nunca me preocupei com essas coisas.
—
E talvez esteja na hora de começar. Uma pessoa que sabe estar bem, sozinha, não
é carente, não vive se agarrando a qualquer companhia pra preencher um vazio.
—
Mas e quando a solidão vem em forma de saudade? Tipo, de alguém que partiu ou
de um amor que acabou?
—
Aí é mais complicado. A saudade é uma forma de solidão, mas também pode ser um
caminho pra solitude. Você aprende a conviver com a falta, a transformar a dor
em crescimento.
—
Crescimento? Como assim?
—
Tipo, você começa a se conhecer mais. A entender que a felicidade não depende
só dos outros, mas também de você.
—
E se a gente não conseguir? Se a solidão for maior que a gente?
—
Aí é importante pedir ajuda. Amigos, família, terapia... Ninguém precisa
enfrentar tudo sozinho.
—
Verdade. Mas e a solitude? Ela não é justamente sobre estar sozinho?
—
Sim, mas solitude não é isolamento. É um momento seu, mas você ainda pode
compartilhar suas descobertas depois.
—
Entendi. Então, solitude é tipo uma pausa pra recarregar as energias?
—
Exatamente! É como se você fosse uma bateria. Às vezes, precisa se desconectar
pra se reconectar.
—
E a solidão? Ela tem algum lado bom?
—
Até tem. Ela nos faz refletir, nos empurra pra mudanças. Mas o importante é não
ficar preso nela.
—
E como saber se estamos presos?
—
Quando a solidão vira um hábito, quando você se afasta de tudo e de todos. Aí é
hora de repensar.
—
E a solitude? Ela pode virar solidão?
—
Pode, se você se perder no processo. Por isso é importante equilibrar. Ficar
sozinho, mas sem se isolar completamente.
—
Equilíbrio é a palavra, então?
—
Sim! Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. A solitude é um remédio, mas em
excesso pode virar veneno.
—
E como a gente sabe que está no caminho certo?
—
Quando você se sente em paz, mesmo sozinho. Quando a companhia de si mesmo já é
suficiente.
—
E se a gente nunca chegar lá?
—
Não tem problema. O importante é tentar. A jornada já é uma conquista.
—
E os outros? Eles podem atrapalhar?
—
Podem, se você deixar. Mas também podem ajudar. Depende de como você lida com
as relações.
—
E como lidar?
—
Sendo sincero. Comunicando o que sente. E entendendo que nem todo mundo vai
entender sua solitude.
—
E se eles acharem que você está fugindo?
— Aí você explica. Mostra que é um momento seu,
mas que você ainda se importa com eles.
—
E se não aceitarem?
—
Aí é problema deles. Você não pode controlar como os outros reagem, só como
você age.
—
E no fim, qual é a maior diferença entre solidão e solitude?
—
A solidão é uma ferida, a solitude é um remédio. Uma te afasta do mundo, a
outra te aproxima de si mesmo.
—
Parece que solitude é tipo um superpoder.
—
E é mesmo! Quem domina a solitude encontra paz.
—
Paz? Que tipo de paz?
—
Paz de não depender da validação constante dos outros. Paz de saber que, mesmo
sozinho, você está inteiro, completo.
—
Isso é complicado...
—
Sim, mas vale a pena tentar. A gente cresce muito quando para de ter medo da
própria companhia.
—
Você gosta de ficar sozinha, então?
—
Gosto. Não é que eu não curta estar com outras pessoas, mas aprendi a valorizar
meus momentos comigo mesma.
—
Como você fez isso?
—
Aceitei que estar sozinha não significa estar abandonada. Depois, comecei a
usar esses momentos pra coisas que me fazem bem: ler, escrever, dançar sozinha
na sala, ouvir música alta sem me preocupar.
—
Não se sentia esquisita?
—
No começo sim. Mas depois percebi que essa esquisitice era só um medo de ser
julgada. Quando você para de se preocupar com o que os outros pensam, fica mais
fácil.
—
Acho que quero tentar isso.
—
Começa devagar. Desliga o celular por uma hora, faz algo que você gosta
sozinho. Aos poucos, você vai ver como é bom.
—
Vou tentar. Quem sabe eu descubra que minha própria companhia não é tão ruim
assim.
—
Tenho certeza que não é. Você só precisa se dar uma chance.
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Solidão
e solitude são experiências diferentes, embora muita gente confunda as duas.
Enquanto a solidão pode ser dolorosa e trazer um sentimento de abandono, a
solitude é uma escolha consciente, onde você encontra conforto na própria
companhia.
Aprender
a gostar de estar consigo mesmo é um processo que leva tempo, mas transforma a
vida. Quando você descobre a beleza da solitude, percebe que não precisa estar
cercado de pessoas o tempo todo para se sentir completo.
Então,
se um dia você se sentir perdido, lembre-se: a chave não é fugir da solidão,
mas transformá-la em um momento de conexão consigo mesmo. É ali que você
descobre o quanto sua própria companhia pode ser incrível.
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