O
barulho das rodas dos skates cortava o silêncio da praça. Alberto estava
sentado no banco, distraído com o movimento dos amigos ao redor. Denise chegou
com um milkshake na mão e se jogou ao lado dele, como fazia sempre. Mas, dessa
vez, ele mal notou.
—
Que cara é essa, Alberto? — ela perguntou, dando um gole no milkshake.
Ele
suspirou fundo, ainda olhando para o chão.
— Sabe aquela minha avó que mora no interior e que sempre
dizia que iria visitá-la e nunca fui? Ela morreu ontem.
Ana
parou de beber e ficou em silêncio por alguns segundos.
— Sinto muito, Beto. De verdade. Você tá bem?
Ele
balançou a cabeça, parecendo indeciso.
— Não sei. Tô pensando muito. Sobre ela, sobre a vida...
essas coisas que a gente só reflete quando perde alguém, sabe?
Antes
que Denise pudesse responder, Charles e Carla se aproximaram, cada um
carregando uma fatia de pizza.
—
Aí, tá todo mundo reunido? — disse Charles, sentando no chão. — Sobre
o que tão falando?
Alberto
deu de ombros.
— Sobre deixar as coisas pra depois e perceber tarde
demais. Minha avó sempre dizia que tinha arrependimentos. Tipo nunca ter visto
o mar ou dizer pro meu avô o quanto ela o amava antes de ele morrer.
Charles
mastigava a pizza, mas parou ao ouvir aquilo.
— Cara, isso é real. Meu tio vive reclamando que nunca
largou o trabalho chato dele pra abrir a oficina dos sonhos. Ele diz que,
quando percebeu, já tinha passado da idade de arriscar.
—
Mas será que isso não é exagero? — perguntou Carla, sentando ao lado de
Denise. — Tipo, não dá pra fazer tudo que a gente quer. Às vezes, deixar pra
depois é só ser prático.
Denise
sacudiu a cabeça.
— Depende. Quando eu era mais nova, queria aprender a tocar
violão. Minha mãe até me deu um, mas eu sempre dizia “amanhã eu começo.” Nunca
comecei. E agora, toda vez que vejo alguém tocando, me arrependo. Não parece
tão prático assim.
Carla
pensou um pouco antes de responder.
— Tá, mas e se você começar agora? O que te impede?
— Nada. Só a sensação de que já passou muito tempo e que
talvez não valha mais a pena.
—
Que besteira! — Charles interrompeu. — Eu entrei numa aula de dança
com 24 anos porque era o que eu queria. Não sou um profissional, mas tô me
divertindo. Ninguém vai te julgar por tentar.
Denise
ficou pensativa. Alberto, então, virou para Carla e perguntou:
— E você? Tá adiando alguma coisa?
Ela
pareceu pegar o grupo de surpresa com sua resposta.
— Tô adiando falar com meu pai. Faz dois anos que a gente
brigou, e eu sempre penso: “depois eu mando uma mensagem.” Mas esse “depois”
nunca chega.
O
grupo ficou em silêncio, cada um absorvendo as próprias reflexões. Então,
Denise quebrou o silêncio.
— Acho que a gente precisa fazer um pacto.
—
Que tipo de pacto? — perguntou Charles, desconfiado.
— Cada um aqui vai fazer hoje uma coisa que tá adiando há
muito tempo. Não importa o que seja. Mas tem que ser algo que vocês sabem que
vão se arrepender se não fizerem.
Alberto
concordou imediatamente.
— Eu topo. Tô adiando uma conversa importante. Acho que
chegou a hora.
Charles
riu.
— Sabe, há muito tempo que estou gostando de uma menina e
fico adiando o momento de dizer isso pra ela. Tenho medo de levar um fora, pois
ela sempre disse que estava esperando o príncipe encantado, e de príncipe,
convenhamos, só tenho o nome.
—
Vou começar o curso de fotografia que sempre quis fazer — disse Denise.
— Chega de desculpas.
Carla
respirou fundo.
— E eu vou ligar pro meu pai. Espero que ele me atenda.
Naquela
tarde, a praça virou uma espécie de tribunal da vida. Cada um deixou ali um
pouco do peso que carregava e saiu decidido a fazer diferente.
No
dia seguinte, Alberto foi o primeiro a mandar mensagem no grupo do WhatsApp: “Conversei
com minha mãe sobre tudo que minha avó dizia. Hoje vou visitar o lugar que ela
sempre quis ir e nunca conseguiu. Sinto que devo isso a ela.”
Charles,
finalmente criou coragem e se declarou pra a menina dos seus sonhos. Hoje, ele
e a Carla estão namorando. Há tempos que ela esperava que ele se declarasse,
mas ele nunca tomava iniciativa.
Os
outros responderam com emojis de apoio e, aos poucos, cada um foi
compartilhando o que estava fazendo para sair da inércia.
Talvez
eles não mudassem o mundo com aquelas atitudes, mas mudaram os próprios mundos.
E isso já era o suficiente para não carregarem o peso de terem percebido tarde
demais.
A
conversa dos amigos deixa uma lição clara: o tempo não espera por ninguém.
Adiar sonhos, conversas importantes ou simples desejos é como apostar em um
amanhã que talvez nunca chegue. Cada "depois eu faço" carrega o risco
de se transformar em um "nunca fiz". A vida acontece no agora, e são
as pequenas escolhas do presente que constroem um futuro sem arrependimentos.
Mesmo que o medo ou a preguiça tentem nos
paralisar, agir é sempre melhor do que viver com o peso das oportunidades
perdidas. Os amigos mostraram que, independentemente da idade ou das
circunstâncias, sempre é possível fazer algo pelo que importa. A iniciativa,
por menor que pareça, é o que separa os que vivem plenamente daqueles que só
observam a vida passar.
Não se trata de acertar sempre, mas de tentar enquanto há tempo. Afinal, quem vive adiando acaba descobrindo que o verdadeiro arrependimento não é pelo que deu errado, mas pelo que nunca teve coragem de fazer.
E você, não está na hora de fazer um pacto desses com você mesmo? O hoje é agora, o amanhã pode ser tarde demais.
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