segunda-feira, 18 de novembro de 2024

Um dia você vai perceber que percebeu tarde demais.

 
            O barulho das rodas dos skates cortava o silêncio da praça. Alberto estava sentado no banco, distraído com o movimento dos amigos ao redor. Denise chegou com um milkshake na mão e se jogou ao lado dele, como fazia sempre. Mas, dessa vez, ele mal notou.

Que cara é essa, Alberto? — ela perguntou, dando um gole no milkshake.

Ele suspirou fundo, ainda olhando para o chão.

— Sabe aquela minha avó que mora no interior e que sempre dizia que iria visitá-la e nunca fui? Ela morreu ontem.

Ana parou de beber e ficou em silêncio por alguns segundos.

— Sinto muito, Beto. De verdade. Você tá bem?

Ele balançou a cabeça, parecendo indeciso.

— Não sei. Tô pensando muito. Sobre ela, sobre a vida... essas coisas que a gente só reflete quando perde alguém, sabe?

Antes que Denise pudesse responder, Charles e Carla se aproximaram, cada um carregando uma fatia de pizza.

Aí, tá todo mundo reunido? — disse Charles, sentando no chão. — Sobre o que tão falando?

Alberto deu de ombros.

— Sobre deixar as coisas pra depois e perceber tarde demais. Minha avó sempre dizia que tinha arrependimentos. Tipo nunca ter visto o mar ou dizer pro meu avô o quanto ela o amava antes de ele morrer.

Charles mastigava a pizza, mas parou ao ouvir aquilo.

— Cara, isso é real. Meu tio vive reclamando que nunca largou o trabalho chato dele pra abrir a oficina dos sonhos. Ele diz que, quando percebeu, já tinha passado da idade de arriscar.

Mas será que isso não é exagero? — perguntou Carla, sentando ao lado de Denise. — Tipo, não dá pra fazer tudo que a gente quer. Às vezes, deixar pra depois é só ser prático.

Denise sacudiu a cabeça.

— Depende. Quando eu era mais nova, queria aprender a tocar violão. Minha mãe até me deu um, mas eu sempre dizia “amanhã eu começo.” Nunca comecei. E agora, toda vez que vejo alguém tocando, me arrependo. Não parece tão prático assim.

Carla pensou um pouco antes de responder.

— Tá, mas e se você começar agora? O que te impede?

— Nada. Só a sensação de que já passou muito tempo e que talvez não valha mais a pena.

Que besteira! — Charles interrompeu. — Eu entrei numa aula de dança com 24 anos porque era o que eu queria. Não sou um profissional, mas tô me divertindo. Ninguém vai te julgar por tentar.

Denise ficou pensativa. Alberto, então, virou para Carla e perguntou:

— E você? Tá adiando alguma coisa?

Ela pareceu pegar o grupo de surpresa com sua resposta.

— Tô adiando falar com meu pai. Faz dois anos que a gente brigou, e eu sempre penso: “depois eu mando uma mensagem.” Mas esse “depois” nunca chega.

O grupo ficou em silêncio, cada um absorvendo as próprias reflexões. Então, Denise quebrou o silêncio.

— Acho que a gente precisa fazer um pacto.

Que tipo de pacto? — perguntou Charles, desconfiado.

— Cada um aqui vai fazer hoje uma coisa que tá adiando há muito tempo. Não importa o que seja. Mas tem que ser algo que vocês sabem que vão se arrepender se não fizerem.

Alberto concordou imediatamente.

— Eu topo. Tô adiando uma conversa importante. Acho que chegou a hora.

Charles riu.

— Sabe, há muito tempo que estou gostando de uma menina e fico adiando o momento de dizer isso pra ela. Tenho medo de levar um fora, pois ela sempre disse que estava esperando o príncipe encantado, e de príncipe, convenhamos, só tenho o nome.

Vou começar o curso de fotografia que sempre quis fazer — disse Denise. — Chega de desculpas.

Carla respirou fundo.

— E eu vou ligar pro meu pai. Espero que ele me atenda.

Naquela tarde, a praça virou uma espécie de tribunal da vida. Cada um deixou ali um pouco do peso que carregava e saiu decidido a fazer diferente.

No dia seguinte, Alberto foi o primeiro a mandar mensagem no grupo do WhatsApp: “Conversei com minha mãe sobre tudo que minha avó dizia. Hoje vou visitar o lugar que ela sempre quis ir e nunca conseguiu. Sinto que devo isso a ela.”

Charles, finalmente criou coragem e se declarou pra a menina dos seus sonhos. Hoje, ele e a Carla estão namorando. Há tempos que ela esperava que ele se declarasse, mas ele nunca tomava iniciativa.

Os outros responderam com emojis de apoio e, aos poucos, cada um foi compartilhando o que estava fazendo para sair da inércia.

Talvez eles não mudassem o mundo com aquelas atitudes, mas mudaram os próprios mundos. E isso já era o suficiente para não carregarem o peso de terem percebido tarde demais.

A conversa dos amigos deixa uma lição clara: o tempo não espera por ninguém. Adiar sonhos, conversas importantes ou simples desejos é como apostar em um amanhã que talvez nunca chegue. Cada "depois eu faço" carrega o risco de se transformar em um "nunca fiz". A vida acontece no agora, e são as pequenas escolhas do presente que constroem um futuro sem arrependimentos.

Mesmo que o medo ou a preguiça tentem nos paralisar, agir é sempre melhor do que viver com o peso das oportunidades perdidas. Os amigos mostraram que, independentemente da idade ou das circunstâncias, sempre é possível fazer algo pelo que importa. A iniciativa, por menor que pareça, é o que separa os que vivem plenamente daqueles que só observam a vida passar.

Não se trata de acertar sempre, mas de tentar enquanto há tempo. Afinal, quem vive adiando acaba descobrindo que o verdadeiro arrependimento não é pelo que deu errado, mas pelo que nunca teve coragem de fazer. 

E você, não está na hora de fazer um pacto desses com você mesmo? O hoje é agora, o amanhã pode ser tarde demais.

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