No centro da cidade, a
Barbearia São Jorge funcionava no mesmo local há mais de 30 anos e mantinha um
número razoável de clientes, sendo que a maioria já eram idosos, frequentadores
antigos do estabelecimento. A barbearia, além do Sr. Jorge, tinha mais cinco
barbeiros e um gerente que, além de barbeiro, cuidava da administração quando o
proprietário não estava no local, o que quase sempre ocorria, haja vista a
saúde já um pouco debilitada do Sr. Jorge.
Felipe,
25 anos, estava na barbearia desde os seus 14 anos, começando como responsável
por recolher os restos de cabelos caídos no chão e por lavar os aventais e
toalhas. Com o tempo, aprendeu o ofício de cabeleireiro e conquistou a
confiança do Sr. Jorge, logo assumindo o posto de gerente.
O jovem gerente notava que, a cada dia, a clientela diminuía e que algo precisava ser feito. Era preciso modernizar, criar novas ideias para atrair os jovens da cidade. Felipe então resolveu ter uma conversa com seu patrão, no intuito de convencê-lo a realizar algumas mudanças.
—
Sr. Jorge, o senhor tem um minutinho? Quero falar sobre umas ideias que pensei
para a barbearia.
O
Sr. Jorge, enxugando as mãos em uma toalha, prestou atenção em Felipe.
—
Claro, Felipe, pode falar. Mas, olha, já adianto: a barbearia tá funcionando
bem assim. Não inventa moda, hein?
Felipe
sorriu, puxou uma cadeira e sentou-se à frente do patrão:
—
Calma, Sr. Jorge. Prometo que não é nada mirabolante. Escuta só. O que o senhor
acha de oferecer combos especiais? Por exemplo: corte de cabelo, barba e,
enquanto o cliente espera para ser atendido, uma limpeza de pele rápida, um
cuidado com as unhas ou um massageador para relaxar. Seria um diferencial que
os concorrentes não têm.
O
Sr. Jorge deu uma gargalhada.
—
Limpeza de pele em barbearia? Isso é coisa de salão de beleza! Aqui os homens
vêm pra cortar o cabelo e a barba, nada mais.
—
Mas é exatamente esse o ponto! — Felipe continuou. — Por que não oferecer algo
diferente? A ideia é criar uma experiência completa, um lugar onde o cara possa
se cuidar e relaxar ao mesmo tempo.
—
Você é jovem, Felipe. Tá querendo transformar a barbearia num spa masculino.
Não vai dar certo.
—
Ok, e se a gente criasse uma “noite de jogos”? Um dia na semana, a gente coloca
videogames ou jogos de tabuleiro na área de espera, serve petiscos e bebidas
não alcoólicas, e o pessoal se diverte enquanto espera pelo corte. Já imaginou?
O
Sr. Jorge franziu a testa e olhou mais sério para o jovem gerente.
—
Jogos? Isso vai encher a barbearia de bagunça. Vai atrasar o atendimento. Não
vejo como isso pode ajudar. Pra mim, o que importa é o cliente entrar, fazer a
barba ou o cabelo, pagar e ir embora.
—
Sr. Jorge, hoje em dia as pessoas procuram experiências, não só serviços. E tem
mais: a gente pode criar um programa de fidelidade. A cada cinco cortes, o
cliente ganha um desconto ou um brinde, tipo um produto de cabelo ou barba.
Isso o incentiva a voltar.
O
Sr. Jorge cruzou os braços, acendeu um cigarro e coçou a barba.
—
Fidelidade? Sei não, Felipe. Isso é complicado, dá trabalho pra administrar.
Melhor deixar do jeito que tá. Esquece essas ideias malucas. Isso é coisa de
louco.
Alguns
meses depois, Felipe, frustrado com a resistência do Sr. Jorge, decidiu sair do
emprego. Ele juntou suas economias, alugou um pequeno espaço ali perto e
inaugurou a própria barbearia: Barbearia Novo Estilo.
Não
demorou muito para a nova barbearia estar movimentada, a cada dia conquistando
novos clientes e Felipe precisando contratar novos funcionários, já somando
oito barbeiros, caixa, entre outros. Havia clientes jogando videogame na sala
de espera, um mural com fotos de “clientes da semana” e profissionais
oferecendo serviços como cortes, barbas, massagens rápidas, corte e limpeza de
unhas e até tratamento facial.
Um
amigo de Felipe, Carlos, foi visitá-lo na barbearia.
—
Cara, tô impressionado com o que você fez aqui. Essa ideia dos combos foi
genial. Todos esses serviços por um preço justo? Todo mundo tá falando disso!
Até lá na faculdade o pessoal tá comentando.
—
Obrigado! Eu sabia que dava pra fazer algo diferente. A ideia não era só cortar
cabelo, mas criar um ambiente onde o cliente se sentisse bem, sabe? E olha o
programa de fidelidade ali no mural. Tem gente que vem só pra completar o
cartão e ganhar o brinde.
—
E a “noite de jogos”? Vi no Instagram que é um sucesso!
—
Pois é! Foi incrível. Fizemos um campeonato de FIFA no videogame. Quem ganhava
levava um voucher pra um corte grátis. O pessoal amou. E mais: aproveitei pra
vender uns produtos de cabelo durante o evento. E tem mais, as palestras de
especialistas sobre saúde e cuidados masculinos também são um sucesso absoluto.
Carlos
olhou ao redor e, abrindo os braços, deu um giro em torno de si mesmo e
comentou:
—
Tá tudo tão moderno e convidativo. Até eu tô com vontade de virar cliente fixo!
—
Esse é o objetivo, Carlos! Cuidar do visual e, ao mesmo tempo, proporcionar um
momento de descontração.
Enquanto
isso, o Sr. Jorge observava as postagens da barbearia de Felipe nas redes
sociais e, vendo o movimento, falou sozinho:
—
Barbearia Novo Estilo… Esse garoto tinha mesmo algo de diferente. Talvez ele
não fosse tão louco assim. Louco fui eu em não acreditar nele.
.-.-.-.-.-.-.-.
A história de Felipe e Sr. Jorge nos ensina duas formas de enxergar a vida. Felipe nos mostra que, às vezes, é preciso acreditar nas nossas ideias, mesmo quando ninguém mais acredita. Poderia ter dado errado? Poderia. Errar também faz parte do jogo. Entretanto, ele não teve medo de arriscar, de fazer algo diferente, e isso fez toda a diferença. Ele sabia que ficar parado, fazendo sempre o mesmo, não o levaria a lugar nenhum. Sua coragem nos inspira a não desistir dos nossos sonhos, mesmo que pareçam loucos para os outros.
Por
outro lado, o Sr. Jorge nos lembra que, às vezes, a gente se prende ao que já
conhece por medo de mudar. Ele tinha experiência, sim, mas fechou os olhos para
o novo. Com o tempo, percebeu que as ideias de Felipe não eram loucura, mas sim
inovação. Isso nos ensina que ouvir outras pessoas e estar aberto ao diferente
pode nos ajudar a crescer. No final, a vida é isso: um equilíbrio entre sonhar
alto e aprender com quem está ao nosso lado.
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